Você acha que o pior já passou e pensa que é seguro voltar a procurar um relacionamento amoroso, mas rapidamente você percebe que se encontra num ambiente inseguro e cheio de predadores á sua volta.
Sim, mesmo que você ache que atingiu o pico da iluminação e se “divorciou” de sua mãe, você ainda atraí idiotas, abusadores, opressores, bastardos egoístas e, pior de tudo, narcisistas.
Como a querida mãe
Os filhos adultos de narcisistas muitas vezes caem em relacionamentos nos quais são usados para desempenhar funções psicológicas para o outro parceiro, ao mesmo tempo que sentem uma sensação de vergonha em relação às suas próprias necessidades e sentimentos. Por outras palavras:
O abuso da mãe narcisista não pára mesmo depois de ter cortado o contato!
Aprender a não confiar
Quando você era bebé, o seu primeiro relacionamento de apego foi com a sua mãe narcisista. Nesse relacionamento você aprendeu que as suas necessidades eram ignoradas, não eram atendidas nem importantes. Você também aprendeu que para ser amado precisava ignorar as suas necessidades e colocar as necessidades da mãe narcisista em primeiro lugar.
A lição aprendida é que você não podia confiar na sua mãe narcisista para atender ás suas necessidades e que as necessidades dela eram mais importantes que as suas.
Inconscientemente, você generaliza esta vivência inicial de como os relacionamentos afetivos funcionam e, passa a sentir o mundo como um lugar onde não pode confiar nos outros. A semente da desconfiança foi colocada no seu no seu ser mais profundo para mais tarde se manifestar em não confiança em si próprio (baixa auto-estima) e também essa desconfiança florescer em relacionamentos adultos.
Reprodução automática
Essas primeiras lições ficam gravadas no nosso inconsciente para futura reprodução automática, fora do controlo consciente.
Veja o seguinte, hoje em dia você não precisa de pensar em como vai andar, como faz para colocar um pé à frente do outro. É um processo completamente automático aprendido na infância. O mesmo se passa com a aprendizagem de modos de relacionamento “amorosos” aprendidos na infância, o relacionamento inicial com a sua mãe narcisista.
O que você aprendeu não foi amor. O que você aprendeu foi estar ao serviço desse adulto, anular-se, e tentar satisfazê-lo para ser amado. Isto é o amor condicional.
O amor condicional não é amor, pois coloca você na posição de ter de fazer algo para ser amado. Você não é amado por ser você mas por fazer algo, por exercer uma determinada função que a mãe narcisista quer e/ou necessita. É uma distorção do verdadeiro amor, preparando você para no futuro procurar relacionamentos onde existe o amor condicional (que é o “amor” que você aprendeu quando criança).
Infelizmente esta programação inicial não é facilmente desaprendida e emerge em situações em que a nossa atenção não está no momento presente, em especial situações de ansiedade e crise. É preciso fazer alguma psicoterapia para identificar, anular essa programação inicial e reaprender o que é o amor incondicional.
Contudo, pessoas há que se iludem pensando que podem através do uso da mente consciente anular essa programação que reside agora no inconsciente. Já tenho visto pessoas a racionalizar, a fazer afirmações, a tentar fazer substituições, mas em vão. É por isso que em novos relacionamentos amorosos e, quando a pessoa menos espera, dá-se conta de estar a fazer o mesmo que aprendeu na sua infância traumática e a sentir que falhou mais uma vez no amor.
A jornada da Ana
Atraente e talentosa, Ana não conseguia entender por que seus relacionamentos terminaram mal. Cada homem com quem ela estava envolvida a deixava, muitas vezes sem qualquer aviso. Ela perguntava-se o que estava fazendo de errado.
Depois do seu relacionamento mais recente de dez anos, o seu parceiro abandonou-a sem explicação ou desculpas.
Pedro disse a um amigo em comum que a Ana se tinha tornado abusiva. Que ele não conseguia mais suportar o comportamento dela. Esta incapacidade de suportá-la foi criado para desculpar sua própria insensibilidade de Pedro. À medida que as mentiras do Pedro começaram a se desfazer, fiquei preocupado com o bem-estar da Ana e suas finanças.
Ela estava presa num negócio em que o Pedro ainda administrava os livros e controlava o acesso aos patrocinadores. A Ana sentia-se insegura e ansiosa para o desastre que se estava a desenrolar á sua frente.
Ao explorarmos a sua história na terapia, descobrimos que o Pedro era apenas o último de uma longa linha de abusadores que se aproveitavam da generosidade e tolerância da Ana. Ele não pagava aluguer da casa fazia dez anos e a Ana ainda estava pagando com cartão de crédito. Mal podia acreditar no que estava ouvindo, enquanto ela contava as mentiras ultrajantes do Pedro.
A Ana entrou na terapia perguntando se o que ela estava fazendo estava errado e se ela estava “abusando” das outras pessoas. Mas era ela quem estava sendo abusada. Todos os homens com quem ela saía parecia que se transformavam numa versão da sua mãe narcisista.
A mãe da Ana, Dona Custódia, era extremamente narcisista e abusiva, e frequentemente abandonava-a quando ela se tornava inconveniente, repreendendo-a por envergonhar a família ao expressar a sua tristeza. Não havia absolutamente nenhum espaço na infância da Ana para validação, reconhecimento ou afeto. A sua mãe era exigente, controladora, expressando-se com raiva, e usando a Ana para os seus próprios objetivos, frequentemente tornando-se punitiva quando a Ana tinha a temeridade de expressar suas próprias necessidades. Não era de admirar que Ana estivesse medo de expressar suas emoções livremente.
A Ana também tinha problemas para criar e manter os seus próprios limites pessoais. Ela era tolerante, a ponto de não fazer perguntas e permitir que outros a tratassem como quisessem. Esse “desamparo aprendido” foi acompanhado por uma atitude “laisse faire” e uma estranha falta de afeto. Ela não expressa emoções e às vezes parecia que ela não tinha nenhuma.
Como filhos de narcisistas, fomos treinados para não valorizar ou mesmo reconhecer os nossos próprios limites pessoais, isto porque os limites pessoais não eram tolerados pelos nossos pais narcisistas. Também fomos treinados para ver os relacionamentos como mutuamente exploradores, em vez de oportunidades de intimidade e ligação humana. Para a Ana, a aprendizagem foi o adquirir de autoconsciência para DIZER NÃO e abster-se de dar livre trânsito aos outros. Embora, é claro, devamos aprender a confiar e nos tornar vulneráveis para ter relacionamentos, isso não é o mesmo que permitir que outros nos explorem sem questionamentos ou limites.
O legado tóxico inconsciente
Embora nunca admitam, os narcisistas dependem dos outros para a sua auto-estima. Quando os suprimentos de aprovação e suporte acabam ou a pessoa abusada tem a temeridade de pedir que suas próprias necessidades sejam atendidas, ela é criticada ou rebaixada pelos seus pedidos, chegando a pessoa a duvidar das suas próprias necessidades, pensamentos e crenças.
Para os filhos de pais narcisistas, isso é muito destrutivo. Eles crescem em uma atmosfera de poder e controle e manipulação. Eles têm de carregar dentro de si o difícil e prejudicial legado da auto-absorção dos seus pais.
Para essas vítimas silenciosas, o narcisismo dos pais criou um vazio onde deveria estar a crescente ligação humana da criança consigo mesma. Negligenciadas e abusadas emocionalmente, elas foram forçadas a negar suas próprias necessidades para serem amadas. Quando adultos, eles continuam a reproduzir inconscientemente esse legado tóxico que os seus pelos pais narcisistas lhes deram. E isto, sem nem mesmo entender porquê.
Que tipo de pessoas os filhos de narcisistas atraem?
Inconscientemente os filhos de narcisistas são frequentemente atraídos por outras pessoas que foram feridas de forma semelhante.
O relacionamento com estas pessoas pode acabar por nos ferir, machucar ou mesmo fazer-nos sentir negligenciados, pois estes nossos amigos e parceiros também estão a tentar lidar com as suas próprias feridas e muitas vezes não vão estar disponíveis para cuidar de nós no momento em que mais precisamos deles.
É frequente as nossas amizades se tornem unilaterais, nas quais a nossa generosidade é puxada até ao limite, por vezes sem retorno. Ou talvez sejamos nós os que recebemos sem dar e acomodamo-nos em relacionamentos que são funcionais em vez de íntimos, ou aceitamos amizades em que os nossos amigos não podem ser eles próprios ao nosso redor. Isto pode parecer uma vitória mas a longo prazo somos nós que perdemos.
Para a Ana e outros como ela, as respostas a estas questões não são fáceis de encontrar sem ajuda profissional.
Com o tempo, autoconsciência e reflexão, podemos dar uma olhada nos nossos valores e no que realmente queremos nas nossas vidas. A terapia pode nos ajudar a explorar as razões de nosso vazio interior e falta de realização.
A psicoterapia com um terapeuta empático pode ajudar a entender as nossas dificuldades nos relacionamentos e separar o legado tóxico do narcisismo dos pais e do abuso emocional a que fomos sujeitos.
À medida que aprendemos a compreender melhor a nós próprios e aos outros, podemos começar a difícil jornada em direção a uma ligação humana significativa e a uma intimidade real.
A Ana precisava entrar em contato consigo mesma para se curar. Quando criança ela foi ensinada a ignorar as suas próprias necessidades e emoções. Daí que tornar-se mais auto-consciente tenha sido um grande desafio para ela, especialmente no que diz respeito a deixar as suas emoções fluirem, nomeadamente a raiva contida durante tanto tempo.
A postura emocional padrão da Ana era de auto-censura. A mãe de Ana utilizava-a como bode expiatório de tudo o que dava errado na família, culpabilizando-a. Os seus irmão não a apoiavam, pois preferiam manter a aprovação da mãe para salvaguardar a sua herança.
Já adulta, a Ana tornou-se o depósito para toda a hostilidade e ganância de homens sem escrúpulos. Isto acontecia devido ao abuso infligido pela sua mãe narcisista que afetou negativamente a sua auto-imagem e levou a Ana a habituar-se a relacionamentos unilaterais.
A Ana teve a sorte de ter amigos que a apoiavam, que entenderam a sua situação e mantiveram-se ao lado dela durante os momentos mais negros. Contudo, os seus parceiros mais íntimos a traíram repetidamente. Assim como sua mãe.
O relacionamento consigo próprio
Os filhos de narcisistas devido ao grave abuso emocional que sofreram têm em geral um fraco sentido de identidade. A experiência de si mesmos é vaga e caracterizada por sentimentos de não se sentirem eles próprios, vergonha, inveja, vazio, fealdade ou inferioridade, ou suas contrapartes compensatórias: ter sempre razão, orgulho, desprezo, auto-suficiência, vaidade e superioridade.
O processo natural de crescer e desenvolver uma identidade autêntica – de se tornar um indivíduo – é distorcido devido aos abusos dos seus pais narcisistas.
Para sobreviver a estes horrores, a criança aprende que deve servir as necessidades dos pais e esquecer as suas. Como parte desse processo, a criança frequentemente incorpora uma voz interna severa e punitiva, julgando-a por qualquer tentativa de ativar seu eu autêntico. Eles também sofrem de vergonha crônica e, em alguns casos, envergonham-se inconscientemente a eles mesmo por terem necessidades ou quererem autonomia para além das expectativas dos seus pais narcisistas.
Pessoas que cresceram com uma mãe narcisista frequentemente parecem perdidas e sem direção. Elas têm dificuldade em compreender e agir de acordo com seus próprios valores e crenças interiores. Elas podem ser ambiciosas ou bem-sucedidas, mas muitas vezes se auto-sabotam porque não estão realmente comprometidos com sua carreira. Suas ambições geralmente são um reflexo do narcisismo dos seus pais.
Assim como a Ana, as pessoas que cresceram com mães narcisistas, estão presas numa luta contínua por auto-definição e serem capazes de actuar de modo autêntico com poder pessoal. O processo de se redescobrirem pode exigir muito trabalho e perseverança mas é de valor incalculável.
Pais narcisistas e o legado da vergonha crónica
As pessoas que sofreram sob o regime de pais narcisistas muitas vezes sentem vergonha crónica. Esta vergonha crónica é uma condição debilitante compartilhada pela maioria das pessoas que foram feridas nos seus relacionamentos iniciais de apego na infância, mas para os filhos de narcisistas, isto é geralmente muito pior.
Por serem avessos à vergonha, os pais narcisistas muitas vezes projectam a sua própria vergonha nos filhos e também usam a vergonha como estratégia de controlo dos filhos. Isto deixa nos filhos intensas e tóxicas consequências emocionais dessa emoção debilitante.
Depois, os pais narcisistas na maioria dos casos não fazem esforço nenhum para “reparar” o relacionamento de apego com os filhos. É comum eles não saberem lidar nem conseguir acalmar os seus filhos pequenos quando estes passam por estados emocionais stressantes, como choro, medo, vergonha, etc. deixando-os por conta própria sem apoio nem amparo. Por vezes, isso pode levar à dissociação, o que torna a criança vulnerável a futuras doenças mentais.
Ser submetido a vergonha frequente afeta nosso sentido de identidade e nossa capacidade de ter relacionamentos saudáveis, incluindo o nosso relacionamento connosco mesmos. As pessoas que cresceram com pais narcisistas muitas vezes consideram-se defeituosas devido ao seu sentido de identidade estar muito “ferido”.
É comum para esses filhos de pais narcisistas experienciarem falhas, deficiências ou lacunas no seu sentido de identidade, podendo o mesmo ser fragmentado devido à dissociação, mas também devido a memórias traumáticas e flashbacks emocionais que podem “sequestrar” os sobreviventes e transportá-los para longe do momento presente e de volta às suas infâncias traumáticas.
Curar as feridas
Curar as suas feridas traumáticas e vai ajudar a parar de criar laços de trauma com outras pessoas.
Filhos adultos de mães narcisistas frequentemente têm dificuldade em reconhecer e aceitar a dor que sentiram quando crianças. Reconhecer o trauma que viveram na sua infância pode levar a sentimentos de dor ou raiva avassaladores. Isto acontece devido ao facto de terem passado a maior parte da sua infância negando suas próprias necessidades. Assim entrar em contato com seu eu autêntico exige um trabalho psicoterapeutico considerável.
A psicoterapia precisa descobrir as camadas de defesa e “esquecimento” que foram usadas para reprimir as suas necessidades e valores genuínos. Ao permitirem-se sentir pela primeira vez, os sobreviventes podem ser atingidos por uma dor intensa pela infância que nunca tiveram e por sua vida perdida. É aqui que o trabalho psicoterapeutico pode fornecer o espaço para o auto-reconhecimento e para a auto-compaixão.
Como a psicoterapia pode ajudar nos traumas de sobreviventes de pais narcisistas?
Curar suas feridas de trauma o ajudará a parar de forjar laços de trauma. Filhos adultos de mães narcisistas frequentemente têm dificuldade em reconhecer a dor que sentiram quando crianças. Reconhecer o trauma de sua infância pode levar a sentimentos de dor ou raiva opressores. Dado que passaram a maior parte da infância negando suas próprias necessidades, entrar em contato com seu eu autêntico exige um trabalho considerável. A terapia precisa descobrir as camadas de defesa e “esquecimento” que foram usadas para reprimir suas necessidades e valores genuínos. Permitindo-se sentir pela primeira vez, os sobreviventes podem ser atingidos por uma dor intensa pela infância que nunca tiveram e por sua vida perdida. O trabalho terapêutico pode fornecer o espaço para o auto-reconhecimento e a auto-compaixão.
Trauma complexo
Na maioria dos casos, aqueles que foram criados em famílias narcisistas terão uma história de trauma complexo. Os sobreviventes têm sintomas de trauma, como hipervigilância, auto-suficiência e flashbacks emocionais. Mas aqueles que sofreram paternidade narcisista também terão problemas contínuos de identidade e auto-definição.
Se você cresceu em uma família narcisista, o abuso emocional que sofreu faz parte de quem você é, para melhor ou para pior.
Por estar ligado ao desenvolvimento inicial, o trauma na infância fica gravado no cérebro e altera a capacidade de responder ao stress e de ter relacionamentos saudáveis.
A psicoterapia para traumas pode ajudar a desvendar suavemente as respostas e reações que têm origem no trauma e permitir que os sobreviventes reconheçam os sentimentos que estão por trás de seu relacionamento tenso com eles mesmos.
Integrar o eu fragmentado
O objetivo da psicoterapia para sobreviventes de pais narcisistas é integrar o eu fragmentado.
Como a vergonha é uma parte crónica da experiência pessoal dos sobreviventes, ela pode fazer com que estes percam contato com as diferentes partes de si mesmos. A psicoterapia pode ajudar a amenizar alguns dos efeitos da vergonha e ajudar os sobreviventes a ganhar consciência dos seus comportamentos, atitudes e respostas. A psicoterapia também pode permitir que sobreviventes de traumas complexos aumentem sua autoconsciência e reactivem o eu autêntico que foi enterrado em resposta à paternidade tóxica.
O relacionamento empático e sem julgamentos que você desenvolve com seu terapeuta é parte do que ajudará a cura.
Ao desenvolver a confiança por meio da psicoterapia, você será capaz de reviver com segurança as partes reprimidas e vulneráveis de si mesmo que foram esquecidas devido ao trauma da infância.
Por meio da empatia e da compreensão, um terapeuta de trauma experiente o ajudará a desenvolver compaixão por essas partes não reconhecidas e traumatizadas de você.
À medida que você ganha mais auto-compaixão e consciência, você descobrirá que os seus sentimentos de vergonha diminuirão. À medida que você começa a se conhecer melhor, você fica mais presente, menos hiper vigilante e mais disponível para si mesmo e para as pessoas importantes na sua vida.
Um psicoterapeuta experiente e empático ajudará a aceitar o legado da paternidade narcisista e a encontrar o melhor caminho para a recuperação.
Se chegou ao momento da sua vida para se libertar desse legado tóxico, não hesite em ter o apoio e ajuda que necessita. Acredite que a psicoterapia poderá ajudar a reencontrar a sua liberdade e capacidade amar.
Deixo-lhe o link directo para marcação da sua consulta MARCA CONSULTA
Nota: os nomes no caso apresentado acima foram alterados por razões de confidencialidade.
Simone diz
Maravilhoso artigo
Dr. Jaime Machado diz
Obrigado Simone!